Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
quando era miúdo costumava ir apanhar a camioneta à rua casal ribeiro para ir à terra, leia-se braga, com o propósito de visitar e mimar a minha avó há muito desaparecida, e o uso recorrente da rodoviária nacional tinha a ver sobretudo com a inexistência de uma ligação ferroviária directa, as que existiam implicavam sempre uma mudança em campanhã e quase sempre uma segunda mudança em nine, algures ao largo de famalicão, uma canseira de malas e alterações de agulha, acontece que do nosso pequeno núcleo familiar só o meu pai não ficava mareado com as viagens rodoviárias cujo arranque a partir de uma garagem instalada numa cave inundada de cheiro a gasóleo nunca prenunciava nada de bom, benditos sacos de plástico, bendito comprimido para o enjoo que trouxe a revolução, um milagre em forma de paz e de sono na era pré-auto-estrada, pré-autopullman, um comprimido que respiguei do arquivo mental hoje mesmo, depois de me confrontar com a reportagem de capa da revista do expresso, a Revista, que me deu alguma vontade de vomitar sem sair do sítio, sou assim, impressionável, o único consolo é que não fui eu que paguei o bilhete de 3 euros para entrar nesta viagem de obsolescência mental aliada a uma insensibilidade social de gente chique nesta loja de porcelana aos pedaços que é portugal, e atenção, há coisas que eu aprecio no jornal, as crónicas do daniel oliveira, os desmandos do luis pedro nunes, as alfinetadas da ana cristina leonardo, os preâmbulos que transpiram classe do pedro mexia que me obrigam muitas vezes a consultar a enciclopédia britânica, vulgo wikipedia, também saboreio a espaços a pluma caprichosa e algumas crónicas escritas no táxi do miguel sousa tavares e invejo o amor pelos livros do josé mário silva e invejo o talento do cartoonista antónio. acontece que me subiu o pequeno-almoço à garganta, agora é respirar fundo, esperar que passe, e em caso de emergência dar uma corrida até à farmácia para gastar os 600 escudos poupados em embalagens de enjomin. parece que nunca falha.
portanto, por ser "trabalhador independente" fui obrigado há meses a criar uma conta via ctt, através da qual recebo toda a correspondência que mantenho com as finanças, notas de liquidação, notificações, coimas, o diabo a sete, o que significa que, daqui em diante, uma empresa privada que herdou uma belíssima base de dados armazenará toda a minha, a nossa, informação fiscal para seu belo usufruto, é isso? ninguém pára o admirável mundo novo da coligação.
nomes, cargos, entradas, posses, promoções e saídas à francesa, ou então à canadiana, irrevogabilidade e interesse nacional, pastas e ministérios, dança de cadeiras e bpn, cv's editados e carreirismo, ministros e secretários, direcções-gerais, défices e pib's, barões do psd e armas, ambos assinalados, flad, estabilidade e responsabilidade, protectorados e resgates, mentiras ou tão somente inverdades, comissões e inquéritos, greves mais ou menos bem sucedidas, coligações, maiorias, swaps, heranças, refer, correlações de forças e democracia, sindicatos, partidos e percentagens e eleições, sondagens e briefings, epístolas de gaspar, nada disto importa, o que conta é que o tuttankhamon de belém ofereceu dois anos a passos para que se façam todos os negócios que contam e os ctt aí estão para prová-lo, entretenhamo-nos com o fogo de artíficio parlamentar e conexos, os pinóquios e os chicos-espertos, pois há outras empresas para entregar às mãos certas que começam a impacientar-se, foram-se os anéis e agora vão-se os dedos, pim.
para a grande sardinhada à integralismo lusitano Sandro espera que ao menos sobre um fogareiro. público.
invasões bárbaras. holocausto. campanha on top of the world da vodafone.
esqueçam o bpn, a sln, o bpp, a flad à grande. vergonha é nomear um gajo elogiado pelo camilo lourenço.
Sandro anda encantado com no martim moniz com o meu pai, Ruca acha estranho que agora até os monhés publiquem livros.
a crise segundo Ruca:
portas confundiu o governo com um preto delinquente. perseguiu-o durante dois anos e matou-o a tiro. foi absolvido por cavaco. o governo ressuscitou em modo zombie.
somos todos americanos.
"nada tenho a oferecer senão sangue, suor e lágrimas" winston churchill
"o homem comum é exigente com os outros; o homem superior é exigente consigo mesmo" marco aurélio
"abri a janela e a primeira coisa que vi foi uma osga pequenina, foi o primeiro animal que eu vi" cavaco silva
quando eu morrer batam em latas é mas é o caralho, soubemos agora do encerramento da Livraria Sá da Costa e na verdade não sinto a faísca da indignação em modo redes sociais, este não é um apelo ao salvamento, sinto-me só triste, desconsolado, por gostar de frequentar livrarias e por durante vários anos ter trabalhado nelas, foram o meu sustento e a minha aflição, a minha bênção e a minha irritação, o meu motivo de orgulho e o meu desgosto, todos os livros à mão semear versus fins-de-semana passados entre muros, até porque quando comecei já a lógica de centro comercial era dominante, são as leis do mercado e o resto, às vezes as boas práticas das cidades europeias não querem nada connosco e se adoro lisboa às vezes também a detesto, porque num piscar de olhos haverá uma loja de sandálias ou de roupa ou de gelados com direito a topping no lugar de uma livraria com história que esteve muitos anos na mó de baixo, que foi alvo de uma espécie de saque por parte do vigarista dinis nazareth fernandes, e que nos últimos tempos se manteve à tona graças a uma vontade de ferro dos seus trabalhadores empenhados em manter-lhe as portas abertas com recurso a amigos e cúmplices, a concertos, recitais, exposições e livros, meu deus, coisa de espantar, livros que a minha gente trata com os pés, fundos de catálogo, edições esgotadas, clássicos, nada disto espanta, estou habituado a ter inveja, melhor, estou habituado a sentir cobiça pelas livrarias de outras cidades que tive a felicidade de visitar, e fico triste porque também isto é uma questão sentimental, de auto-flagelação e território, os livros são o melhor do mundo, os livros não interessam para nada, há negócios mais rentáveis e a vida faz-se disso, de economia, de oportunidades de negócio, de franchisings, na verdade nunca houve uma idade de ouro dos leitores, sempre foram poucos, as condições de arrendamento, a pressão especulativa, as lógicas de marketing e de renting é que eram outras, e agora até haverá mais leitores, sucede que há muitos supermercados por onde escolher, sem livreiros e com funcionários, ou "colaboradores", baptismo do capital selvagem que veio para ficar, supermercados que praticam descontos sobre as capas com verniz a que as livrarias não podem chegar, supermercados onde os portugueses também gastam cada vez menos, menos 3,7% (ficam-me bem as percentagens) no primeiro semestre de 2013, a doutora jonet tem razão, não se pode comprar bifes todos os dias, não se pode comprar livros todos os dias. no próximo sábado pode-se. no próximo sábado a Sá da Costa vai a enterrar a partir das 21h. batam em latas mas é o caralho.