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bom, Sandro espera que ela saiba como é que essa história acabou.
chegaram aos magotes, durante todo o dia, briosos, arranjados, malcheirosos e andrajosos, de cabelo armado ou farripas na testa, seguros, aleijados, enxutos e curvados, com muletas, andarilhos ou filhos pelos braços, vagarosos e vestidos à domingo, de fato de treino, bengala, óculos de ver ao perto, com cartões de eleitor desbotados, bilhetes de identidade vitalícios ou modernos cartões do cidadão, com olhos baços, sorrisos nos lábios, peneirentos e doentes, cegos, amblíopes e cheios de lucidez, cansados, distraídos, valentes, molhados, perfumados e impacientes, tremeliques e cheios de escolhas firmes, chegados de casas, de lares, de ambulâncias, mancos, marrecos, altivos ou com cadeiras de rodas, lestos, atarantados e montados em ténis de corrida, porque hoje os velhos da minha freguesia, da minha secção de voto, saíram à rua, encheram-se de brios, mandaram abaixo a média nacional de abstenção e deram uma lição de democracia e cidadania aos miúdos pós-modernos que adoram a liberdade do seu umbigo que nem sequer pensam em preservar.
bravo, peste grisalha.
é que apesar da austeridade, do programa que foi além da troika, da engenharia social, do aumento da pobreza, dos cortes nos salários, dos cortes nas pensões, do definhamento dos abonos, da demissão irrevogável e das privatizações nos saldos, do caos na justiça (acabou a impunidade, dizia ela) e do empurrar da educação para as mãos dos privados, apesar do aumento enorme de impostos e das medidas inconstitucionais, da emigração massiva, do desemprego com números recorde, do aumento da precariedade, do crescimento da dívida, dos hospitais sem betadine (nota pessoal) e do fim do rsi, apesar da reforma do estado a triplo espaço e dos vistos gold, apesar do miguel macedo e da tecnoforma, da segurança social por pagar e da ministra que fez swaps, apesar dos cortes na ciência e do fim do ensino artístico, apesar da guiné equatorial e do orçamento microscópico da cultura, do novo banco que ainda vamos pagar e das contas escondidas, do relvas e do fecho dos tribunais, das colocações de professores e do assistencialismo, da sobretaxa e do fogo cerrado sobre a função pública, apesar dos 50% de portugueses que ganham menos de 8000 euros por ano e dos polícias que batem quando não sobem escadas do parlamento, apesar dos medicamentos em falta nas farmácias e dos velhos que voltaram a ter de cuidar dos filhos e do recuo sem precedentes do pib, apesar disso as coisas, no fundo, até correram bem.